A subimissão da mulher
Não seria a primeira vez ouvir a lista do machismo e horror crescente dispensado ao tratamento de mulheres no Islã; Meninas proibidas de ir à escola e condenadas ao analfabetismo. Mulheres impedidas de trabalhar e de andar pelas ruas sozinhas. Milhares de viúvas que, sem poder ganhar seu sustento, dependem de esmolas ou simplesmente passam fome. Mulheres com os dedos decepados por pintar as unhas. Casadas, solteiras, velhas ou moças que sejam suspeitas de transgressões - e tudo o que compõe a vida normal é visto como transgressão - são espancadas ou executadas. E por toda parte aquelas imagens que já se tornaram um símbolo: grupos de figuras idênticas, sem forma e sem rosto, cobertas da cabeça aos pés nas suas túnicas - as burqas. Para o pensamento ortodoxo muçulmano, a mulher vale menos do que o homem. Todos esses horrores voltaram a espantar o ocidente com mais força que nunca após o ataque de terroristas do Afeganistão ao World Trade Center e o Pentágono. As mulheres viviam em regime de submissão havia muito tempo, mas a situação ficou ainda pior desde que a milícia Talibã tomou o poder no país, em 1996.
O pior é a carência de poder nesta questão, porque por tratar-se de uma religião, os mandamentos dela devem ser aceitos e respeitados pela sociedade, como previsto nos direitos humanos. Trata-se de uma avenida permanentemente aberta aos regimes islâmicos que desejem interpretar os ensinamentos do Corão a ferro e fogo. No entanto, a exclusão feminina não está presente nas fundações do islamismo. O Corão, livro sagrado dos muçulmanos, contém versículos dedicados a deixar claro que, aos olhos de Alá, homens e mulheres são iguais. Como se explica, então, que idéiam tão avançadas tenham se perdido, para dar lugar a Estados religiosos em que as mulheres têm de viver trancafiadas e cobertas por véus, em pleno século XXI?
Há países de islamismo mais flexível, como o Egito, e outros de um rigor extremo, como a Arábia Saudita. A pesquisadora Leila Ahmed tem mais explicações para a opressão das mulheres no Islã. Os muçulmanos, diz ela, costumavam manter os hábitos das regiões onde se firmavam, desde que esses estivessem em sintonia com seu pensamento. O restante era descartado. Na Arábia, por exemplo, eliminaram as outras formas de casamento para que prevalecesse apenas o patriarcal. Quando conquistaram a região que hoje abarca o Irã e o Iraque, assimilaram a prática de formar haréns, o uso disseminado do véu para as mulheres e, principalmente, os mecanismos de repressão feminina que eram uma característica marcante dos povos locais. Foi nesse ambiente altamente misógino que, nos séculos seguintes, o direito islâmico foi elaborado. Separado em escolas que diferem em vários pontos, mas se apresentam como sendo timbres diversos de uma só voz, esse direito é dado como absoluto e imutável. Seus princípios não podem ser questionados nem relativizados à luz de traços culturais.
Até hoje, são um instrumento útil para calar as mulheres em países nos quais vigora o regime teocrático. Um dado complicador é que as muçulmanas têm até hoje um conhecimento muito vago da lei divina. Aderem ao fundamentalismo atraído pelos ideais de pureza da religião e, quando ele é instaurado, são surpreendidas por seus rigores. É possível ser, ao mesmo tempo, uma muçulmana livre e uma muçulmana fiel. Se a democracia chegou para as mulheres que vivem sob o escudo da civilização judaico-cristã, não há por que ela não possa ser almejada pelas muçulmanas que se orgulham de sua religião.
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